Vick
E quando parou para entender o que via, percebeu que não mais bastava deixar ir. Tinha que sentir a dor do rasgo e ver também o sangue pingar para se fortalecer. Veja, não mais se falava das lágrimas, que há muito foram inutilizadas por serem muito dramáticas, por doerem mais do que a cabeça suporta, falamos em choque.

Ir, vir... Antes como, agora fato: ninguém se importa. Quem sabe quanto tempo mais levará até que também não se importe?

Não existem fotos suficientes para perpetuar o passado. Não nesse caso. E também já não há esperança de que venham novas, nem mesmo em novas circunstâncias.

Da memória resgatou uma pequena história, de corações com retalhos, mas nunca pensou que veria o seu retalhado para perder os pedaços que ganhara.

Então os dias se fizeram mais comuns.
Vick
Não sumiram as palavras. Elas nunca somem. Mas eu sim. Me fiz sumir, me escondi num beco tal que nem eu seria capaz de me ver; nele construí muros, arranjei escudos, rotas e covas para nunca mais estar encurralada, em desvantagem (pobre de mim, iludida como sempre). Não queria ser princesa em castelo, queria somente ser homem em guerra, protegendo cada centímetro do corpo, da alma… E mesmo que eu mostrasse tudo, nada seria, de fato, revelado. E como há diferença entre os dois…

Foram anos sonhando, meses saboreando… Depois eu não mais sabia onde estava. Perdi. Perdi de vista. Perdi tudo. Perdi o viço pelo meu vício. E não procurei (enquanto agüentei não saber nada). E agora se foi. Dessa vez, de vez.

Os últimos tempos foram como montanha-russa de parque itinerante. Sem altos nem baixos de verdade, mas com o desejo de emoção que se impõe a cada nova temporada. E a vontade era tanta que esqueci do resto. Era a sede de viver algo novo, emocionante, fora dos padrões que nunca deveriam sequer ter sido cogitados. Uma experiência tal que fugiu do controle no momento em que se iniciou. Lógico. Se depende da resposta do outro, não está mais no meu mundo, não tenho como controlar.

E eu nem queria todas as nuances… Até então queria só os tons pastéis, pois achava que eles dariam o tom certo para quem não queria se arriscar nos tons vivos. Mas um momento! Eu sou viva, ora! Sou grande, curiosa, desastrada... Nada disso está refletido num rosinha, azulzinho, amarelinho... Não tenho espaço em mim para o diminutivo. Não gosto de ser assim. Não tem detalhe a ser observado quando está tudo mais ou menos. Mais ou menos não me serve. Não mais.

Quero o mundo e todas as cores. E, pela primeira vez, acho que estou buscando de um jeito leve. Não certo. Apenas leve. Quero o mundo, o meu mundo, e mais ninguém. Agora nem sei se sou eu de verdade, porque não me lembro de não querer ninguém, embora nem sempre tenha desejado algo. É novo. E não me assusta.

Já que poucas são as coisas que me encantam, não vou mais perder tempo com o óbvio. Perdi tempo com as coisas certas vistas por uma perspectiva totalmente equivocada. Não fui sincera porque achei que não era hora de ser sincera e perdi mais detalhes, mais pessoas, mais coisas que poderiam ter mexido de verdade comigo. Pensei demais, pensei pelos outros, pensei em tudo, menos em mim.

Agora que esvaziei corpo e alma, chega. É tempo de procurar novos detalhes, novos encantos.