Vick
Penso em todo o medo que já tive das pessoas e vejo como eu era infantil. Não que eu tenha tomado a pílula da maturidade e hoje esteja esbanjando uma sabedoria senil, muitos passos me faltam, lógico... Mas já me dou o direito de achar ridículo o comportamento alheio. Não falo de celebridades ou de algum “wannabe something” que exista pelo mundo... Me refiro aos que acreditava conhecer...

Eu tento entender como nós nos deixamos influenciar de tal maneira que afeta àqueles que nos cercam... E não consigo. Sabe quando você diz que não suporta estupidez e não responde um simples bom dia? Ou quando diz ojerizar burrice e passa a não oferecer nada que acrescente? Ou também quando brada lealdade e quebra a confiança de alguém em dois toques? Eu poderia passar dias citando exemplos muito bem conhecidos por mim e mais outros tantos dias citando exemplos que eu mesma represento, mas não é o caso. Vim aqui para falar do papel de quem influencia e até agora só passeei por devaneios sobre quem é influenciado.

Minha mãe, uma vez, me disse que tem gente que surge para somar e gente que surge apenas para subtrair. Normalmente eu procuro somar, então vamos falar mal de quem só subtrai. E trai. Porque, convenhamos, é uma imensa traição unir-se a alguém para tirar o que o outro tem de melhor sem nem ao menos ajudar a polir e assim aumentar o brilho do outro. É uma questão de quanto você está disposto a compartilhar... Se acaso alguém se perdesse num desses infinitos labirintos impostos pela vida e soubesse como chegar até a metade do caminho e você soubesse por onde ir a partir dela, você, naturalmente, se uniria ao outro para, juntos, saírem de tal mazela, certo? Talvez para mim, talvez para você... Mas para algumas pessoas, é mais fácil conquistar a confiança do outro, roubar a parte que não lhe cabe e seguir do ponto em que o outro não é mais útil. Eu fico pensando em duas coisas: na dor de quem foi usado e na esperteza burra de quem se aproveitou do bom coração alheio...

Quem é enganado, sente, sofre, chora, se desespera, mas levanta e segue... Consegue, por seus próprios méritos, sair de onde não lhe convém. Essa pessoa fará tecerá outras teias, montará outros esquemas, conhecerá novas pessoas, fará novos amigos, encontrará novos amores, sabores... Mas quem confia no parasitismo vai para onde? Nenhuma relação, entre humanos, se sustenta nesse sistema. Quem não saber somar fica sozinho, com muito, mas sem o essencial. De que adianta ter ou ser “o ou a mais” alguma coisa e não ter com quem dividir todo o prazer do resultado? Quando eu dizia que a felicidade estava no caminho, nas margens, eu não estava mentindo... Mas não se pode ficar solitário durante esse caminho... Entre companhias vazias e o vazio, eu tendo a preferir o vazio... Assim alguma alma, algum detalhe, pode preenchê-lo perfeitamente... Até que novos bons se agreguem... Até que os parasitas caiam... Até que os infortúnios não façam mais tanta diferença...

Eu sinto pena de quem se deixa influenciar por tais parasitas... Normalmente acabam tão sozinhos quanto quem lhes sugou o brilho, mas eles ainda têm uma chance... Mas eu sinto uma pena, ou desprezo, muito maior por quem não sabe influenciar, por quem isola, por quem suga sem contribuir, por quem usurpa a alma dos outros como um demônio ceifador controlado por alguém que tem medo da morte.

Vick
Versos Inscritos numa Taça Feita de um Crânio

Tradução de Castro Alves

Não, não te assustes: não fugiu o meu espírito
Vê em mim um crânio, o único que existe
Do qual, muito ao contrário de uma fronte viva,
Tudo aquilo que flui jamais é triste.

Vivi, amei, bebi, tal como tu; morri;
Que renuncie e terra aos ossos meus
Enche! Não podes injuriar-me; tem o verme
Lábios mais repugnantes do que os teus.

Onde outrora brilhou, talvez, minha razão,
Para ajudar os outros brilhe agora e;
Substituto haverá mais nobre que o vinho
Se o nosso cérebro já se perdeu?

Bebe enquanto puderes; quando tu e os teus
Já tiverdes partido, uma outra gente
Possa te redimir da terra que abraçar-te,
E festeje com o morto e a própria rima tente.

E por que não? Se as fontes geram tal tristeza
Através da existência -curto dia-,
Redimidas dos vermes e da argila
Ao menos possam ter alguma serventia.

Vick
Eu passei muito tempo sem escrever aqui... Mas foi o tempo que precisei para me reconfortar...

Nesse tempo eu passei muitas noites sem encontrar a posição ideal na cama, questionando pessoas, atitudes, pensamentos, frases, arrependimentos... Foi como se estivesse liberando espaço no meu disco rígido. E valeu a pena. Muita coisa foi jogada fora... Coisas que eu já sabia que me faziam ou viriam a me fazer mal algum dia. Incrivelmente. Eu ignorava esses impulsos e seguia de cabeça nas minhas viagens. E isso foi bom para me tornar uma pessoa melhor, maior. Mais ríspida, talvez, mas fez parte do processo.

Pensando bem, eu nunca tive e ainda não tenho do que reclamar, do que me arrepender. É uma carga muito estranha e pesada para assumir aos dezoito anos. Eu vivo e não sinto falta de nada. As minhas crises de riso, de choro, de raiva, de histeria... São todas válvulas de escape minuciosamente arquitetadas por mim, para ter do que reclamar e me arrepender. Agora parece que aprendi a conviver com esses fantasmas e surpotar minhas falhas como qualquer ser humano.

Eu perco, ganho, engano, sou enganada, aposto alto, saio de fininho quando não sei o que fazer... E se for encarar assim, sou mais ou menos como um torneio de pôquer. Só que agora comemoro as mãos altas em vez de chorar pela falta da carta que mudaria toda a minha partida. Estranho e altamente engraçado, mas é assim que acho justo. O que posso fazer? Não ligo mais para os “enormes problemas” do passado... E faço isso porque cansei dele. Não quero mesmo.

Agora estou com síndrome de Mulher Maravilha. Nenhum labirinto parece me deter. Estou objetivada a crescer, amadurecer e trazer para o meu lado aqueles que fazem por merecer o meu esforço. O resto? Já disse... É só o resto.

AGORA

All Good Things - Nelly Furtado