Vick
A beleza do caos só é percebida por quem não é, de fato, atingido por ele...
As perspectivas frustradas, as possibilidades quebradas, os fatos desagradáveis, as dores no corpo e na alma, os excessos, as faltas, a acomodação... E confesso não saber o que é pior... Se a acomodação por qualquer que seja o motivo ou a nutrição de expectativas sobre qualquer que seja a coisa. Todo esse conjunto de fatores revoltantes são belíssimos e de alto poder utópico para quem não é usado como marionete deles...
Malditos vampiros... Acabam aos poucos com você... Tiram a tua saúde, o teu brilho, a tua vontade, o teu sangue e a tua alma... Deixam "viver" apenas um pedaço de carne com alguns frágeis ossos sustentando um desequilibrado equilíbrio desequilibrado...
Os que desfrutam de algum milagre já não ligam para a situação alheia... O caos já não os afetam. Ou será que fingem não se deixar afetar!? Vai saber... Ainda espero por algum meu...
O prazer de viver, quando em gozo, é capaz de cegar os que o gozam... É benção e maldição... Um presente da vida que massageia e conforta a alma, mas que também pode furar os olhos...
Não sei se não entendo por que isso acontece porque simplesmente não consigo entender ou se porque não quero... Não sei. Mas sei que quero o meu milagre...

"Agora, talvez mais do que nunca, eu preciso do meu milagre"...
Não me lembro bem, mas acho que ouvi algo do tipo no filme "Melhor é impossível", já citado por aqui...
E, honestamente, onde ouvi é o que menos me importa agora... O que importa é que eu preciso... E muito. E com urgência. Preciso logo do meu milagre... Preciso logo de um pouco dessa cegueira adocicada e leve... De um pouquinho de boa vontade da vida para me deixar dar mais alguns passos sem sentir tanta dor...
Eu estou acomodada. E nutrindo expectativas (sobre não sei o quê, mas ainda assim nutrindo. - o que é bem pior.). Já não suporto mais esperar por ele... Já acho que há algo errado nisso... Não deve ser corriqueira tamanha demora...
As porradas chegam rápido... As dores, os músculos cansados, os hematomas... Mas e o afago!? A mão que espanca não fará o carinho!?

Eu até tento andar com pedras e tacos para revidar... Mas as minhas costas doem... Eu sinto cada grama pesar como toneladas... É peso demais sobre o corpo cansado... Mais que sobre o corpo, sobre a alma.
A alma de quem não aceita o momento como simples momento, que não aceita viver só de esperanças, que acredita nas inúmeras possibilidades que a vida pode traçar, que busca ter um pouco da paciência e do poder de reconstrução de monges, que procura fazer o sempre certo sempre; a minha alma está cansada... Ela deita cansada todos os dias como o meu corpo, mas cede a sua energia para que ele se levante no dia seguinte para se cansar um pouco mais... E descansa quase nunca. Ela precisa que todas as outras almas que quer proteger estejam bem e que o meu corpo esteja longe dos vampiros do caos para só então poder relaxar... Mas isso é difícil... Muito difícil mesmo...
E sempre há um outro ser que ignora a luta da pobre alma... Apunhala sorrateiramente... Magoa por prazer, por não se importar, por vários motivos ilusórios... Mas sempre justificativas pouco aceitáveis para tamanha crueldade...

Meu corpo e minha alma não têm mais outra saida a não ser continuar lutando contra a acomodação, contra as esperanças e as expectativas, contra as possibilidades infundadas, contra a deterioração dos que possuem alto valor... Contra alguns dos demônios do caos...
Quem sabe assim eu possa desfrutar de algum milagre e me deixar cegar um pouco por ele... Só um pouco... Mas é que preciso sentir um pouco do gosto dessa leveza... Um pouco que seja... Para não me acomodar mais como estúpida que sou...
Preciso de algum milagre, algum impulso que me anime a lutar de novo... e sempre.